No dia 21 de Março, partimos da Escola Secundária de Serafim Leite, pelas 13.30h, rumo à cidade de Vila Nova de Gaia. O objectivo desta visita de estudo era assistirmos à tão célebre peça de teatro "Felizmente há Luar!", de Luís de Sttau Monteiro, obra leccionada no âmbito da disciplina de Português, mas apenas no 3º período. Esta visita de estudo contou com a participação da maior parte das turmas de 12º ano da nossa escola.


Esta peça, composta por dois actos, seria interpretada pela companhia de teatro TEP (Teatro Experimental do Porto), no Auditório do Centro Cultural e Social de Olival.

Todos nós, baseados na explicação da peça, por parte da professora desta disciplina, Dina Sarabando, esperávamos uma peça totalmente dramática e melancólica, pois esta não seria a primeira vez que a nossa escola visitaria este espaço e que seria espectadora desta peça, interpretada por este grupo de teatro. No entanto, a companhia surpreendeu-nos com uma apresentação e representação totalmente diferente do habitual.

Esta obra dramática aborda uma tentativa falhada de Revolução Liberal em que o suposto líder seria o General Gomes Freire de Andrade. O drama narrativo começa, então, com um monólogo de Manuel (o mais consciente dos populares) que comenta o estado lastimável da nossa nação, referindo as invasões dos franceses e dos ingleses e, ainda, a actual regência de Portugal. Seguidamente, um Antigo Soldado fala-nos do General Gomes Freire de Andrade, aquele que o povo tanto aclamava e esperava que, um dia, liderasse a revolta liberal. Aqui, Vicente, um elemento do povo, discorda das palavras do Antigo Soldado e chega, até, a proferir alguns comentários desagradáveis acerca do general.

Dadas as condições da altura, surgem, constantemente, dois polícias que fazem questão de terminar com os ajuntamentos do povo, de modo a evitar conspirações. Vicente é levado pelos dois polícias para se apresentar perante D. Miguel Forjaz, um dos três governadores do reino, tornando-se, aqui, um traidor do povo e obtendo o papel de denunciador daqueles que conspiram contra o reino português, a fim de obter o posto de chefe da polícia.

Os três governadores do reino pretendem, assim, encontrar aquele que lidera toda a conspiração, que conduzirá a uma revolta liberal. Apesar de serem apenas rumores do povo e de nada ser provado, estes atribuem esta responsabilidade ao General Gomes Freire de Andrade, fazendo dele um bode expiatório que mostrará ao povo as consequências das conspirações. Termina, assim, o primeiro acto desta peça.

Já no segundo acto, o general é levado para S. Julião da Barra, a fim de ser condenado e executado, sem ter a possibilidade de obter qualquer visita até à hora da execução. É aqui que aparece Matilde, esposa de Gomes Freire de Andrade, que tenta, a todo o custo, provar a inocência do marido com a ajuda de António de Sousa Falcão, o companheiro fiel e amigo da família.

Matilde e Sousa Falcão recorrem aos governadores do reino e ao povo, mas tudo isto em vão, pois a morte do general era algo inevitável. O Estado não olhava a meios para atingir os fins e, tal como em todas as situações, há sempre um sacrificado que, neste caso, foi o General Gomes Freire de Andrade.

A obra tem um final bastante dramático, com um monólogo de Matilde, em que esta, acompanhada de António de Sousa Falcão, observa, de longe, a fogueira em que o seu marido será queimado. Aqui, esta usa a saia verde que o seu marido lhe tinha oferecido, em Paris, para o “receber”, pela última vez. Despede-se, deste modo, para sempre, do seu amado, condenado à morte por um crime que nunca cometeu. Injustiças à portuguesa!

Esta peça de teatro, de visualização obrigatória, homenageia um autor que, através da escrita, desmascarou e denunciou aspectos de ordem social e política do regime salazarista e, simultaneamente, lutou pela esperança e liberdade de um povo oprimido pela miséria em que viveu. Este foi um espectáculo inteiramente criativo e interactivo com o espectador que não se limitou apenas a observar e a escutar a história, mas que também a integrou. De certo modo, uma alegoria à nossa existência na história e em toda a História, pois, pelas palavras do encenador, “a história repete-se”.

E, de facto, a peça de teatro não só nos permitiu uma melhor integração da obra de Sttau Monteiro, como também nos levou a reflectir em tempos passados da actualidade do escritor (1961), durante todo o período do fascismo.

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Nesta obra estiveram bem representadas as várias classes deste período, desde os indivíduos das camadas populares, os que dormiam no chão e os que pactuavam com as forças da repressão, com o objectivo de denunciar outrem, a troco de benefícios, simbolizados nas personagens Vicente, Andrade Corvo e Morais Sarmento e os dois polícias; passando pelas classes soberanas que exploravam e oprimiam o povo, representadas pelo marechal Beresford, um estrangeiro; pelo Principal Sousa, um padre; e por D. Miguel Pereira Forjaz, constituindo, assim, o governo; e ainda as forças ideológicas simbolizadas pela personagem de Gomes Freire de Andrade como a consciência popular, que é omisso durante toda a peça.

Assim, estas diferentes faixas de hierarquização não só estiveram muito bem figuradas pelas suas representações, claro, mas também enaltecidas com o auxílio de uma espécie de pedestal, que se encontrava no centro do cenário, onde estas se sentavam, permitindo ao observador percepcionar melhor qual a ordem de hierarquização das respectivas entidades.

Na nossa opinião, apenas temos como negativo a acústica da sala que dificultou a audição de personagens como Matilde que nos desiludiu um pouco pela sua falta de emotividade e projecção de voz.

Como aspectos positivos consideramos que a situação precária do povo esteve sempre muito bem evidente nas personagens Rita, o Antigo Soldado, a Velha, Manuel e Vicente, tanto ao nível de figurinos como de actuações, sendo, talvez, as personagens que mais se destacaram, durante toda a encenação, simbolizando, sempre, com o maior rigor, o símbolo da consciência popular.

A interacção dos dois polícias com o espectador, movimentando-se por toda a plateia, também é tido como um ponto a favor desta peça, porque, para além de permitir que o público não se aborrecesse devido à demorada encenação, também fez com que este se sentisse em constante vigia como se fizesse parte das vivências passadas por aqueles homens, dos medos e das suas angústias.

Quanto ao cenário, todo este foi bem aproveitado e assinala-se, neste sentido, a sua simplicidade. O cenário estava deveras original, principalmente porque o luar era caracterizado com o candeeiro e, mais uma vez, a alusão à actualidade.

Os efeitos de luz favoreceram todo o palco e a actuação das personagens, criando diversas emoções no espectador.

Também a música, no final do espectáculo, trouxe até nós um sentimento de esperança, porque felizmente há luar, a esperança de um mundo melhor em que tudo é música e teatro. Consideramos que o facto de as personagens usarem o célebre discurso de Martin Luther King (“I have a dream…”) enriqueceu muito a teatralização.

Contudo, para o grande final, fez-se uso de uma música moderna e as personagens surgiram a dançar, afastando-se, assim, bastante, do final trágico e dramático de toda a peça. Apesar de ter sido um momento bastante divertido, não foi, de todo, ao encontro da obra original.

Toda a peça foi representada com ironia, porque existiram vários momentos de riso, mas tal só enriqueceu a peça, pois tornou a representação original e menos monótona e fez ainda com que existisse mais interacção com o público, um ponto forte a favor da avaliação da companhia.

Talvez tenham decidido mudar esta representação para algo mais ‘divertido’, na medida em que, neste momento, o nosso país se encontra num estado crítico, tal como na época em que esta obra foi escrita, no tempo salazarista.

Apesar de a história ser vivida numa outra época histórica, esta obra tinha como principal objectivo criticar o governo de Salazar. Mas, visto que se viviam tempos de ditadura, foi preciso recorrer a um outro momento histórico para relatar a actual realidade, usando a técnica do distanciamento histórico.

Ler uma obra é mais do que imaginar o que o narrador nos pretende transmitir … É criar cenários, personagens e acções e, para isso, é necessário o teatro. O teatro não só nos permite assistir a uma história, como também vivenciá-la e interferir nela.

Em “Felizmente Há Luar!”, teatralizado pelo TEP, conseguiu-se tudo isso. Não só fez chegar até nós a história como também nos envolveu nela e nos divertiu. Por outras palavras, conseguiu tocar-nos na coração.

 Na aula

Já na aula de Português, no dia 26 de Maio, a turma do 12º C “pôs mãos à obra” e representou uma peça inspirada na de Sttau Monteiro, idealizada e escrita pela professora de Português, Dina Sarabando, a qual recebeu o nome “Felizmente Ainda Há Luar!”. Aqui os actores foram os próprios alunos: Sérgio Rebelo (Manuel); Rita Bastos (Rita, esposa de Manuel); Jani Nogueira (Vicente); Andreia Santos (Polícia); Vera Alves (Morais Sarmento); Tânia Santos (Andrade Corvo); Renata Costa (D. Miguel Pereira Forjaz); Catarina Saavedra (Principal Sousa); Bebiana Silva (António de Sousa Falcão); Sérgio Paiva (Frei Diogo); Andrea Cadete (Beresford); Marta Pereira (Matilde de Melo), Sara Santos (General Gomes Freire de Andrade); e Marco Costa (Luís de Sttau Monteiro). Os alunos sentiram-se, deveras, na pele de todas aquelas personagens movimentadas, em 1961, pela pena de Mestre Sttau Monteiro.

Foi, realmente, um momento digno de louvor, para mais tarde recordar …

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